sexta-feira, 27 de agosto de 2010

o Mago Químico e o MDMA


 Alexander Shulgin recebendo Hamilton Morris em seu laboratório

Apesar do nome de Alexander Shulgin não ser exatamente familiar, ele é sem dúvida o químico psicodélico mais importante que já existiu. Aqueles que o conhecem costumam saber apenas sobre o seu papel na redescoberta e popularização do MDMA. Mas o MDMA é apenas um dos mais de cem compostos químicos que compõem a farmacopeia de Shulgin que se entende tão profundamente no desconhecido que ele precisa constantemente inventar novas expressões para descrever os seus efeitos (“ruptura ocular” é uma de minhas preferidas). As drogas são auditivos seletivos e alucinógenos táteis, psicodélicos que dilatam o tempo ou colocam o usuário em um estado de confusão amnésica, são antidepressivos, afrodisíacos, estimulantes, empatógenos, entactógenos, neurotoxinas e pelo menos um inseticida bem lucrativo bem lucrativo. Também são alguns dos remédios mais valiosos que o homem conhece e, apesar de apenas uma pequena parte deles ter sido formalmente estudado, são as melhores ferramentas de que dispomos para compreender a composição química humana.
A carreira e Shulgin começou na empresa Dow Chemical, onde ele fez nome ao sintetizar o Zectran, o primeiro inseticida biodegradável. Depois desse sucesso, ele recebeu carta branca para trabalhar com os químicos que quisesse. Ele escolheu os psicodélicos e se dedicou à criação de uma anfetamina chamada DOM, que na época só ficava atrás do LSD em termos de potência. Uma única dose generosa chega a durar 48 horas. Em 1967, um químico do Brooklyn, Nick Sand, percebeu o potencial comercial da droga. Ele construiu um laboratório industrial em São Francisco onde cozinhava DOM em um panelão de sopa de 150 litros, e vendia por quilo para os Hells Angels, que cruzavam os EUA despejavam dezenas de milhares de tabletes de 20 mg de DOM extremamente potentes sobre o público. Esse influxo despirocou hordas de hippies no Golden Gate Park.
Enquanto isso, a menos de uma quadra Tompkins Square Park, a polícia de Nova York derrubou a porta de uma igreja psicodélica chamada Igreja da Exaltação Mística em uma batida matutina. A polícia aprendeu cerca de oito milhões de dólares em drogas psicodélicas, incluindo 1.500 doses de DOM, dois pés de maconha e “inúmeros colchões”. Notícias de uma epidemia de surtos induzidos pelo DOM enchiam os jornais, um usuário em Mahnhattan ingeriu uma dose e realizou um ritual de haraquiri, estripando a si mesmo com uma espada de samurai no Dia das Mães. A essa altura, a droga ainda não tinha sido identificada, e o New York Times alternava as informações ora dizendo que se tratava de um gás tóxico militar secreto, ora que se tratava do “caviar de drogas psicodélicas”. Acabaram descobrindo que o DOM era resultado das pesquisas farmacêuticas conduzidas por um então desconhecido químico da Dow. Como era de se esperar, a Dow não ficou contente com isso. Assim que a fonte foi identificada, as relações entre Shulgin e a Dow foram cortadas.
Livre da Dow, Shulgin montou seu próprio laboratório no quintal de casa e passou a pesquisar drogas com total independência e com a consciência de que as substâncias químicas que criava tinham o potencial de ir parar na mente de pelo menos um milhão de pessoas. Ele testava pessoalmente cada novo composto e, quando achava válido, também testava em sua esposa e amigos, sempre dando ênfase especial às propriedades sexuais dos psicodélicos (ou, como diz o próprio, “o erótico”). Ao longo de 50 anos, Shulgin concluiu o mais exaustivo exame de estruturas psicodélicas jamais feito e produziu um leque de drogas que rivalizava com a produção de muitas gigantes farmacêuticas. O tempo todo preservou sua sanidade e cavalheirismo, tocando viola, dando aulas na universidade e comparecendo a saraus de elite no Bohemian Grove.
Texto de Hamilton Morris, farmacologista

Alexander "Sasha" Shulgin (Berkeley, 17 de Junho de 1925) é um farmacologista, químico e pesquisador de drogas russo-estadunidense.
Shulgin popularizou o MDMA no final dos anos 70 e início dos anos 80, especialmente pelos seus usos em tratamentos psicofarmacêuticos e tratamento de depressão e desordem depressiva pós-traumática. Nos anos seguintes, Shulgin descobriu e sintetizou mais de 230 componentes psicoativos. Em 1991 e 1997, ele e sua esposa Ann Shulgin escreveram os livros PiHKAL (Phenethylamines I Have Known and Loved) e TiHKAL (Tryptamines I Have Known and Loved), ambos sobre substâncias psicoativas. Atualmente continua seu trabalho em sua casa em Lafayette, Califórnia.


Nenhum comentário:

Postar um comentário